Wednesday, January 09, 2008

Traddutora, Traditora?



O trabalho de tradução/interpretação ultrapassa o simples entendimento e transposição da palavra e da gramática de uma língua para a outra. Neste sentido, o tradutor/intérprete assume-se como um verdadeiro intermediário social, político e cultural, um ser dividido entre tempos, momentos e espaços, capaz de estabelecer a ligação entre mundos e culturas, elemento centralizador e catalisador desse encontro plural com o outro através da palavra. Neste processo de encontro e abertura protagonizado pelo Novo Mundo, tantas vezes caracterizado pela mestiçagem e miscigenação racial, cultural e linguística, é-nos apresentado um novo paradigma da abertura ao multiculturalismo.

Talvez o mais fascinante e influente intermediário do século XVI tenha sido, não um europeu, nem um homem, mas antes uma nativa indígena, mais concretamente Doña Marina ou a La Malinche, como ficou conhecida, a intérprete de Cortez durante a conquista do México.

É assim que nasce a figura e cresce o mito em torno de Doña Marina, simultaneamente, uma figura na margem e no centro, periférica e central, proscrita, traidora e cortesã, amante e intérprete de Cortez, porque ela era, afinal, a figura através da qual passava toda a comunicação entre os aztecas e os espanhóis

Simbolizando o hibridismo e a mestiçagem, elemento de ligação entre dois mundos em conflito e criando, ao mesmo tempo, um outro mundo à parte, La Malinche, Malintzin ou La Chingada funciona como figura de destaque no lugar ocupado pela língua e retórica e peça-chave daquilo a que muitos chamam de“máquina de propaganda representacional europeia”, personificando o vastíssimo processo de tradução cultural iniciado pelos Descobrimentos.


P.S. Agradeço, a propósito, as simpáticas palavras do colega Adelto Gonçalves que teve a gentileza do ler e comentar, no site Verdes Trigos, o meu texto “Traddutora,Traditora? Tradução, mestiçagem e multiculturalismo no feminino”.

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